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miércoles, 3 de julio de 2013

EVERARDO NORÕES [10.218]


EVERARDO NORÕES
Nació en la ciudad de Crato, Ceará, BRASIL en 1944. Vivió en Francia, Argelia y Mozambique.

Poesía: 

Poemas Argelinos (Ed. Pirata, 1981); Poemas (Fundação de Cultura da Cidade do Recife, 2000); Nas entrelinhas do mundo, em co-autoria (Ensol, 2002); Le tigri del Bengala - tradução de Emilio Coco Edizione Nuove Muse, S. Marco in Lamis, Itália, 2005).
Co-autor do texto da peça Auto das portas do Céu, de Ronaldo Brito. Organizou a obra completa de Joaquim Cardozo, que se encontra no prelo (Editora Nova Aguilar).





Flamboyant

reviento
el corazón del verde
en esta tarde
es cuando el sol florece
jaboticabas al pie
maduro color del ojo
divino
es un color indefinido
hálito que no se describe
sólo soy
el encarnado

reviento
el corazón del verde
y sangro
al ritmo regular
y persistente de la lluvia
entonces
discurro lo que pasa
sobre esta mancha
que ensucia
la avaricia de los días.

Traducción: Mario Martínez Sobrino




Flamboyant

arrebento
o coração do verde
nesta tarde
é quando o sol
flora,
jaboticabas no pé
madura cor do olho
divina
é uma cor indefinida
hálito que não se descreve
sou apenas
o encarnado

arrebento
o coração
do verde
e sangro
ao ritmo regular
e persistente
da chuva
então
discurso
ao que passa
sobre esta mancha
que encarde
a avareza dos dias.







Fractales

Por la inmersión
de las sombras
calculo
el itinerario de la luz.
Mido los contornos de nuestras ruinas
en la matemática particular
de las desesperaciones.

Abro la ventana
de la página del sueño.
Deletreo, despacio
el Aywu Rapitá:
el ser del ser de la palabra,
(flor pronunciada entre las estrellas).
La noche
se derrumba sobre las tejas
en la explosión de un meteoro.
Cuento esquirlas,
recompongo parábolas:
un mínimo de lo que soy
recuerda las fronteras
del Universo.

Traducción: Mario Martínez Sobrino




Fractais

Pelo mergulho
das sombras,
calculo
o itinerário da luz.
Meço
os contornos de nossas ruínas
na matemática particular
dos desesperos.

Abro a janela
da página do sonho:
soletro, devagar, o Aywu rapitá:
o ser do
ser da palavra,
(flor pronunciada entre as estrelas).
A noite
desaba sobre
as telhas
na explosão de um meteoro.
Conto estilhaços,
recomponho
parábolas:
um mínimo do que sou
lembra as fronteiras
do Universo.






Sertão

As nuvens são baixas,
mas alto é o céu.
O que parece passar,
permanece.

O verde, no cinza
se descobre.
A luz,
da escuridão se tece.

O verbo afia,
a faca desafia:
no oculto de mim,
tudo é Sertão.







De 
RETÁBULO DE JERÔNIMO BOSCH 
Rio de Janeiro: 7Letras, 2008. 126 p. 



O peixe-homem fugiu da tela 
através do azul-turquesa 
de um quadro de Klee. 
Desconhecia 
as plantas do Jardim das Delícias,
as classificações botânicas, 
os itinerários, a música da sala: 
flutuou no ar. 

Suas palavras 
brilharam como esferas magnéticas. 
E num farfalhar de águas, 
desapareceu da tela 
em direção ao retábulo 
de São Jerônimo Bosch.



Voz movediça: 
areia a escorrer entre as horas, 
recolhida numa sombra 
para ser escutada, 
como se escuta uma luz, 
arrefecida no silêncio da casa: 
esvaída em cinza, 
sumida 
num monturo 
de lembranças. 


11

Para Luiz Arraes 

O sentimento das pedras 
entoava em nós 
o cântico 
de tua presença. 
De dentro de suas paredes 
as igrejas recitavam a promessa 
de algum hino. 
E as casas 
rimavam cadeiras nas calçadas, 
alpendres, sobrados, quintais. 
Cidade sem muros: 
só morada. 
Aqui e ali, 
pé de jasmim, fruta-pão, 
fícus-benjamim. 
Ninguém se atrevia 
a duvidar do vento, 
a incomodar a chuva. 
O sol era mais sol 
a fustigar nossa pele. 
E as ruas, 
com nomes de coisas, 
mais humanas. 





Mancha 

Sob as palavras 
tudo se transfigura: 
a urze, a pedra, o horto. 
As cabras pastam, 
as vacas ruminam, 
e é muito tarde 
para rimar teu nome. 
Sobre nós flutua 
o encoberto, 
nuvem suspensa 
ao fio da saliva, 
mancha de desterro. 
Sob as palavras, 
tudo se derrama, 
como o leite 
numa mesa de pensão.





Sesta 

o galho de árvore 
a penetrar na nuvem 
pássaro a resvalar 
no clarão da pele 
lampejo de água 
na chuva adormecida 
sopro de luar 
no cobre da bandeja 
um sim dissimulado 
na dobra do vestido 
augúrio de festa 
no aceso de dentro 
molécula explodida 
no cristal 
da taça






De
A RUA DO PADRE INGLÊS 
Rio de Janeiro: 7 Letras, 2006 



CEMITÉRIO DE MUCUGÊ

Do desterro de pedra,
contemplo
a pequena cidade muda.
Escalo seus andares,
a mão se fere nas cinzas
dos seus ossos.
A cal ofusca,
a nuvem cala:
nunca mais eu voltarei aqui.

Nunca mais eu voltarei aqui,
para despir a paz dos Meteoros:
o lume que se esconde nas aguadas,
o garimpo do corpo,
os epitáfios.

As bromélias sangram nos meus pés.
Avisto a lousa cega,
o muro descarnado.
Um bordado de letras — seus insetos —
o escalar das heras
nos portais.
Devo subir degraus,
sangrar os lábios,
resvalar pelas pedras meus pecados;
arrancar do umbigo das colinas,
a raiz do silêncio,
Teu mau-trato,

Do desterro de pedra
me contemplo:
urna luz repartida entre as ruínas,
um azul que alucina
as tuas águas...






O LICOR DO SEGREDO

Saber na boca
o licor do segredo,
como obscuro servo
no mais alto degredo.
Escalar o corpo
é redimir as cinzas,
mudar o fogo em sombras
desdobrar as ondas.






OS DADOS DO DÍA

Deduzem-se
os dados do dia
entre as garras do gamão.
Raro sopro de alegria
sôbolos rios que se vão.



POEIRAS NA RÉSTIA

De 
POEIRAS NA RÉSTIA 
Rio de Janeiro: 7 Letras, 2010



Tiradeira de leite 

entre os dedos 
o fulgor do leite 
filtra a desordem solar 
o curral aprisiona 
o sossego dos bichos 
o negro viscoso do olho 
a refletir vasilhas 
o ramo da árvore 
a sombra do regaço 
cedo a manhã cheira 
e tudo se acorda 
na precisão do mato 
ou do alento 
que chega do açude 
no remanso das entranhas 
dessas nuvens lentas 
lentas 
lentas 
lentas





Rimbaud matemático 

Recompôs 
todas as incógnitas 
e com letras gregas 
desvendou como 
subjugar o infinito. 
Depois, 
armou-se 
para o duelo: 
anotou equações, 
descreveu as curvas do sonho, 
e aguardou a bala 
para a conclusão 
do último 
teorema.




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